Trabalhar com mais inteligência, não com mais esforço — esse é o objetivo.
E é exatamente aí que o BIM (Modelagem da Informação da Construção) se destaca.
Katherine Weir reuniu uma série de estudos de caso que comprovam o impacto positivo dessa tecnologia no setor da construção, mostrando como ela pode transformar projetos em histórias de sucesso.

A evolução contínua do BIM: digitalização, IA e gêmeos digitais moldando o futuro da construção
O Building Information Modelling (BIM) segue em constante avanço, impulsionado por inovações em digitalização, softwares de dados, inteligência artificial (IA), câmeras e a crescente adoção dos gêmeos digitais. Com o tempo, a principal barreira para sua adoção deixou de ser a maturidade da tecnologia — e passou a ser a falta de educação e treinamento no setor.
Para responder à pergunta “Como o setor da construção pode extrair o máximo do BIM?”, uma série de estudos de caso internacionais mostra como a tecnologia vem sendo aplicada com sucesso em diferentes contextos.
Gêmeos digitais em ação: o caso da Interstate 70, no Colorado
Com o objetivo de aumentar a segurança e a mobilidade ao longo da interstate I-70, uma das rodovias mais congestionadas e perigosas do Colorado, o Colorado Department of Transportation (CDOT) está conduzindo uma modernização de um trecho de 12 km na região de Floyd Hill, a cerca de 40 km a oeste de Denver.
O projeto, avaliado em US$ 700 milhões, tem como foco eliminar gargalos, melhorar o fluxo de tráfego e aumentar a eficiência nos acessos.
A AtkinsRéalis, responsável pela engenharia e pelo projeto, trabalha com o CDOT para realinhar a rodovia, reconstruir pontes e pavimentos, além de substituir infraestrutura obsoleta. Segundo Samuel Worthy, gerente nacional de BIM para estradas e rodovias na AtkinsRéalis, os desafios vão desde a preservação de áreas ambientalmente sensíveis até o controle de escavações e o planejamento de obras para minimizar impactos no tráfego existente.
Para enfrentar esses desafios, a equipe utilizou modelagem 3D colaborativa e gêmeos digitais da Bentley Systems, criando representações realistas acessíveis em tempo real para toda a equipe e stakeholders.
“Para alcançar esse nível de coordenação, usamos o ProjectWise como ambiente de dados comum. Isso nos permitiu criar modelos 3D rapidamente e avaliar parâmetros como geometria e visibilidade”, explica Worthy.
Combinando o uso do iTwin para construção de gêmeos digitais, OpenRoads e OpenBridge para design geométrico colaborativo e modelagem de pontes, além do LumenRT para visualização, a AtkinsRéalis conseguiu otimizar o gerenciamento de dados em todas as etapas do projeto.

(Foto: Graphisoft)
A equipe desenvolveu um gêmeo digital completo do projeto, compartilhado em diversos formatos — de modelos estáticos a animações em vídeo —, promovendo transparência e colaboração em tempo real com as partes envolvidas.
Segundo a Bentley Systems, essa abordagem gerou uma economia de US$ 1,2 milhão ao permitir o gerenciamento eficiente de mais de 1.000 planilhas por meio dos aplicativos da Bentley. A hospedagem de 11.070 arquivos em um ambiente de dados conectado simplificou a coordenação e resultou em uma economia adicional de US$ 750.000. A digitalização também reduziu 97% do esforço necessário para criar e publicar gêmeos digitais para revisão, e até o momento, estima-se que tenha economizado 50 mil horas de trabalho e mais de US$ 7 milhões em custos totais de projeto.
BIM e sustentabilidade no Ártico: o Icefjord Centre na Groenlândia
O BIM também tem sido uma ferramenta poderosa na busca por construções mais sustentáveis. Um exemplo marcante é o Icefjord Centre, localizado em Ilulissat, na costa da Groenlândia, a apenas 250 km ao norte do Círculo Polar Ártico.
O centro atua como um polo de educação climática, documentando os impactos do aquecimento global, como o derretimento da segunda maior camada de gelo do planeta.
Projetado por Dorte Mandrup, o edifício de 1.500 m² tem um design angular e assimétrico, integrando aço, madeira e vidro de forma harmoniosa com a paisagem. Um deck no topo permite uma vista privilegiada das formações de gelo que estão em constante transformação.
Contratada para construir a estrutura de aço, a dinamarquesa Give Steel utilizou o Tekla Structures, da Trimble, para otimizar o projeto estrutural com foco em sustentabilidade. Entre as soluções adotadas estão:
- Uso de energia geotérmica neutra em CO₂ para aquecimento;
- Materiais locais no restaurante do centro;
- Redução de desperdícios e transporte por meio de um modelo construtivo digital.

(Foto: Bentley Systems)
Para a engenheira estrutural Kasia Niechoj-Zaporowska, líder do departamento técnico da Give Steel na Polônia, o projeto do Icefjord Centre representou mais do que um desafio técnico — foi uma oportunidade de alinhar engenharia à responsabilidade ambiental.
“Como produtores de estruturas de aço, estamos muito focados no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12 da ONU, que trata de consumo e produção responsáveis. Quando começamos o design do Icefjord Centre, ficou claro como o projeto está diretamente ligado ao aquecimento global. Pensamos muito sobre como reduzir nossa pegada de carbono — às vezes, pequenas decisões fazem uma grande diferença”, afirma Kasia.
O projeto arquitetônico foi inicialmente desenvolvido no Revit, e os arquivos IFC gerados foram transferidos diretamente para o Tekla Structures pela equipe da Give Steel. A integração entre plataformas possibilitou uma colaboração eficiente e fluida.
Durante o desenvolvimento, os engenheiros identificaram que simplificar as conexões de aço não só reduziria o uso de materiais, como também facilitaria a fabricação e montagem. Além disso, o modelo BIM foi usado para coordenar todas as disciplinas envolvidas, prevenindo conflitos em obra e garantindo maior precisão. Conforme os princípios da metodologia BIM, todos os subcontratados trabalharam com o mesmo modelo integrado, o que assegurou consistência e controle ao longo de toda a execução.
BIM na requalificação urbana: o caso Everards Printworks, em Bristol
Na cidade de Bristol, Reino Unido, o estúdio escocês AMA Studio enfrentou um desafio duplo: preservar o patrimônio histórico e modernizar uma estrutura desativada. A missão era transformar o antigo Everards Printworks, um edifício de escritórios abandonado, em um hotel 4 estrelas com 255 quartos, além de novos apartamentos e espaços comerciais.
O briefing exigia a manutenção da fachada histórica tombada e de boa parte da estrutura de concreto existente. Com isso, foi possível preservar os elementos arquitetônicos de valor histórico e, ao mesmo tempo, reduzir significativamente o carbono incorporado, quando comparado a uma construção totalmente nova.
A AMA Studio foi contratada pela construtora McAleer and Rushe (MAR), representando a Artisan Real Estate UK, para desenvolver o projeto com base em uma proposta anterior do escritório Alec French Architects.
Durante todo o processo de design e construção, a AMA utilizou o Archicad, da Graphisoft, para importar e exportar arquivos IFC, garantindo colaboração contínua com consultores e subcontratados e facilitando a coordenação interdisciplinar.

A complexidade do projeto de requalificação do Everards Printworks, em Bristol, exigia uma abordagem altamente coordenada — e foi justamente o uso do BIM com Archicad que possibilitou isso.
A ferramenta permitiu que todas as disciplinas envolvidas trabalhassem de forma integrada no modelo 3D, viabilizando decisões precisas e colaboração contínua.
Além disso, o BIMx foi essencial tanto no canteiro de obras quanto nas reuniões com o cliente. Os links diretos para plantas e seções no Archicad facilitaram a comunicação técnica e ajudaram a resolver dúvidas com agilidade — um diferencial crucial em um projeto tão intricado.
Durante o processo de planejamento, o modelo Archicad também foi exportado para o Twinmotion, permitindo a criação de vídeos passo a passo. Essa combinação entre simulação visual e modelagem BIM foi considerada “inestimável” para demonstrar os impactos das alterações de design em visualizações externas sensíveis — um ponto decisivo em projetos com restrições patrimoniais e urbanísticas.
Digitalização como base para planejamento: o exemplo da Vorwerk na Alemanha
Em Laaken, Alemanha, a fabricante de eletrodomésticos Vorwerk Wupper Süd modernizou suas operações com a construção de duas novas instalações: uma planta de motores de 23.000 m² e um centro de pesquisa de 17.000 m². Após a conclusão, a empresa de arquitetura Jan-André Meyer Architects foi encarregada de criar um gêmeo digital das edificações.
Para isso, uma equipe de apenas duas pessoas realizou a digitalização completa dos ambientes em apenas cinco horas, utilizando um fluxo de trabalho “scan-to-plan” com os dispositivos Leica BLK2GO (portátil) e BLK2FLY (scanner a laser autônomo voador).
As nuvens de pontos geradas foram processadas para criar plantas baixas precisas e um modelo 3D navegável, acessível tanto por computador quanto em realidade virtual (VR).
- O BLK2GO foi usado para escanear os interiores e parte da paisagem ao redor das construções.
- O BLK2FLY fez o mapeamento aéreo das fachadas e da estrutura externa.
Esse modelo digital agora serve como base para operações, manutenção e futuras expansões, demonstrando como a digitalização pode ser uma aliada estratégica não só no planejamento, mas em todo o ciclo de vida de uma edificação.

O processo de captura das instalações da Vorwerk Wupper Süd começou pelo exterior. A equipe definiu a trajetória de voo do drone utilizando um aplicativo móvel, garantindo uma cobertura precisa de toda a área. Algumas seções mais complexas do exterior foram escaneadas manualmente, complementando os 12 voos autônomos realizados sem a necessidade de repetir o procedimento.
Com os dados capturados pelos dispositivos BLK2GO e BLK2FLY, o próximo passo foi o processamento das informações. A equipe da Meyer Architects retornou ao escritório e, por meio de uma conexão USB-C, importou os dados para a versão BLK do software Cyclone Register 360. Nesse ambiente, os dados foram integrados e combinados em uma nuvem de pontos unificada representando todo o complexo da Vorwerk.
Em apenas duas semanas e meia, a equipe entregou ao cliente:
- Plantas baixas 2D precisas
- Modelo 3D navegável das instalações
Esses entregáveis digitais são uma base sólida para projetos futuros, pois permitem que empreiteiros e projetistas tenham acesso imediato a dados detalhados, reduzindo a necessidade de visitas ao local.
Agora, os envolvidos podem navegar virtualmente pelo edifício, seja em um computador ou por meio de óculos de realidade virtual, o que otimiza desde o planejamento até a execução de novas obras ou manutenções.
Perguntas e respostas de especialistas: fio condutor de informações
Conversamos com a Dra. Marzia Bolpagni, diretora associada e chefe de BIM internacional no Mace Group para descobrir o que ela vê como as principais oportunidades do BIM no setor de construção, bem como como ele pode se desenvolver no futuro.
Onde você acha que a construção está com a adoção do BIM?
BIM é uma jornada. Acredito que a adoção ainda varia na construção. Para algumas organizações, BIM é ‘business as usual’ e elas agora estão olhando para inteligência artificial e outras metodologias e tecnologias da ‘Indústria 4.0’. Outras ainda estão na infância de sua jornada e, infelizmente, ainda acreditam que BIM é um custo extra.
Qual você vê como o melhor uso do BIM na construção?
Há tantos usos! Um dos melhores usos ainda é a coordenação entre disciplinas e partes interessadas. No entanto, o gerenciamento de informações (a base do BIM) é essencial para habilitar o fio dourado da informação e impulsionar um futuro sustentável.
Como você acha que será o futuro do BIM na construção?
No momento, há muitas tendências, de gêmeos digitais a IA generativa. No entanto, minha esperança é que o setor implemente o básico primeiro, os princípios de gerenciamento de informações se tornarão o novo normal e haverá regulamentações claras sobre o uso ético de dados ao aplicar IA.
