Ambiente macroeconômico pressiona setores inovadores, com queda nos investimentos e na demanda.

A indústria de alta tecnologia no Brasil enfrenta uma desaceleração significativa em 2025, pressionada pela elevação dos juros, a volatilidade cambial e um cenário externo incerto. Após registrar crescimento de 3,8% no PIB de 2024, a indústria de transformação perdeu fôlego com o agravamento das condições econômicas.
Segundo Rafael Cagnin, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), os setores com maior intensidade tecnológica são os mais impactados, uma vez que dependem de altos investimentos e financiamento para produção e consumo. Por comercializarem produtos de maior valor agregado e frequentemente adquiridos a prazo, esses segmentos sentem diretamente os efeitos dos juros elevados.
A experiência da Novus, fabricante de equipamentos eletrônicos para automação industrial, exemplifica esse contexto. A empresa está há dois anos sem captar dívidas e postergou investimentos em sua planta de Canoas (RS). De acordo com o CEO Marcos Dillenburg, com taxas acima de 15% ao ano, não é viável assumir financiamentos de longo prazo. A retração atinge também seus clientes, que têm adiado projetos de expansão, o que afeta diretamente a demanda por equipamentos.
Dados do Iedi revelam que a produção da indústria de transformação cresceu apenas 2,5% no primeiro trimestre de 2025, abaixo dos 4,5% registrados no trimestre anterior. A queda foi ainda mais acentuada nos setores de alta intensidade tecnológica, cuja expansão caiu de 15% no quarto trimestre de 2024 para 1,9% nos três primeiros meses de 2025.
Os segmentos de máquinas e equipamentos e eletroeletrônicos foram os mais afetados. José Velloso, da Abimaq, relembra que, em 2021, quando os juros estavam em 2% ao ano, o setor cresceu 28%. Desde então, a escalada da taxa básica de juros tem provocado uma retração persistente. Humberto Barbato, da Abinee, destaca que o setor eletroeletrônico reduziu sua projeção de crescimento de 5% para algo entre 3% e 4%, pressionado pela alta do dólar e pela dependência de insumos importados.
A volatilidade cambial também afeta o planejamento industrial, ao dificultar a previsibilidade dos custos em reais para importações e exportações. A guerra comercial global agrava o quadro: com os EUA restringindo importações da China, cresce o temor de uma invasão de produtos chineses no mercado brasileiro. Em 2024, as importações de máquinas da China aumentaram 36%, segundo a Abimaq.
Para a Novus, a alta dos juros tem impacto ainda maior do que o câmbio. Isso porque 50% da receita da empresa vem de exportações para 65 países. Embora 90% dos insumos sejam importados, a receita em dólar ajuda a compensar as oscilações cambiais. Além disso, distribuidores nos EUA sinalizam aumento na demanda, o que pode representar uma oportunidade estratégica diante do bloqueio comercial entre China e EUA — ainda que, segundo Dillenburg, seja cedo para prever se esse movimento será duradouro.
Em contraste, setores de média-baixa intensidade tecnológica, como alimentos e bebidas, continuam apresentando bom desempenho. A Abia projeta investimentos de R$ 120 bilhões até 2026. A Nestlé, por exemplo, elevou seu plano de investimento no Brasil para R$ 7,5 bilhões, com foco na linha de cafés até 2028. Mesmo com os juros elevados, a demanda interna aquecida e o crescimento da renda sustentam os planos, afirma João Dornellas, presidente da Abia.
Contudo, o Iedi alerta para a falta de coordenação da política econômica, que gera distorções entre os incentivos ao consumo e a política monetária restritiva. Para o economista Jonathas Goulart, da Firjan, o descompasso entre as ações do governo e do Banco Central cria um ambiente que encarece os investimentos e limita o crescimento da indústria.
